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“Pagar para trabalhar”. Mudança radical de vida para professores colocados longe de casa

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A reportagem é da Lusa e fala da dura realidade que alguns professores vivem este ano.

Colocados longe de casa, os professores tiveram três semanas para mudar de vida, muitos vão separar-se das famílias e dizem que com ordenados tão baixos e rendas tão altas terão de “pagar para poder trabalhar”.

(continue a ler o artigo a seguir)


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Este ano os serviços do Ministério da Educação conseguiram divulgar mais cedo as listas de colocação de professores. “Foi numa sexta-feira 13”, recorda Lurdes Mendes, 59 anos, que descobriu há duas semanas que em setembro começa a dar aulas numa escola a mais de 300 km de casa.

A professora de Filosofia vai trocar o Porto por um apartamento alugado em Odivelas. “Os concursos são sempre um tiro no escuro”, diz à Lusa, reconhecendo que agora, que o filho tem 26 anos, estas mudanças são mais fáceis. Mas há “muitos colegas a atravessar situações complicadas”.

É o caso de Maria Silva, 40 anos. Com duas filhas de quatro e sete anos, soube em meados de agosto que a 1 de setembro teria de se apresentar na nova escola em Lisboa, a 350 km de casa.

“De um momento para o outro a vida dá uma volta inesperada”, diz à Lusa a professora, criticando o ministério por anunciar as colocações em agosto “como se fosse um grande feito”.

“São menos de três semanas para arranjar uma casa, um jardim-de-infância e uma escola de 1.º ciclo, numa altura em que as vagas no público já estão preenchidas. Se calhar só arranjamos lugar num privado”, desabafa a mãe, contando que ainda está a ponderar a hipótese de a filha mais velha ficar com o pai.

Depois de 15 anos a contratos, Maria Silva seguiu o conselho de colegas e tentou entrar para os quadros do Ministério da Educação. Ficou colocada na zona de Lisboa (QZP-7) com um ordenado de 1200 euros.

Agora faz contas à vida: além do empréstimo da casa do Porto, terá o encargo da casa alugada em Lisboa. As faturas da água e da luz serão a dobrar e há ainda que somar as viagens ao fim de semana, enumera.

“Podíamos, ao menos, ter direito a ajudas de custo, como acontece com os deputados e os juízes. Nós não vivemos do ar”, critica.

Além do stress de ter 19 dias para se reorganizar, Maria Silva sente-se novamente responsável por “mexer com a vida de toda a família”.

“Quando contámos às miúdas que iam para Lisboa e o pai ficava no Porto começaram a chorar. É terrível ter de separar as crianças do pai, do resto da família e dos seus amigos. Parece que somos criminosos. Qual é o nosso crime? Querer ser professor?”, desabafa.

Também a educadora de infância Cristina Gonçalves, de 54 anos, sublinha o impacto destas andanças nos mais novos: “Não faz nada bem às crianças andar sempre de um lado para o outro, não conseguem criar vínculos, e isso nota-se”.

Para Cristina Gonçalves é incompreensível como é que o Governo se diz preocupado com os alunos, mas “depois esquece-se que os professores também são pais e têm filhos”.

No caso de Cristina, a maior preocupação são os pais, que vão ficar novamente sozinhos. Nos quadros há três anos, concorreu para todas as escolas desde “Valença à Venda do Pinheiro”. De Lisboa para baixo não tentou, porque “era muito longe de casa”. Ficou na Venda do Pinheiro.

“Vai ser uma despesa muito grande. Nós pagamos para trabalhar. Estes próximos anos vão servir apenas para tempo de serviço. Nós não nos recusamos a nada, continuamos sempre a trabalhar”, diz.

Cristina reconhece que o ministério tem feito um esforço para antecipar a divulgação das listas de colocação. Nos mais de 30 anos de profissão houve alturas em que teve de ficar em hotéis, quando as listas eram divulgadas a 28 de agosto: “Às tantas estávamos a trabalhar nas escolas sem termos casa”, recorda.

Para muitos professores, a divulgação das listas dos últimos concursos veio desorganizar “uma vida que parecia organizada”, conta Maria Santana, professora de Inglês.

Prestes a fazer 48 anos, Maria faz parte do grupo dos 12.500 professores que concorreram ao concurso interno e, na próxima semana, começam a trabalhar numa nova escola.

Colocada em Lisboa com um ordenado de 1100 euros, diz que terá de recorrer às poupanças, mesmo dividindo casa.

“As casas em Lisboa são muito caras, por isso tive de optar por um quarto. Vou ter de partilhar espaços comuns, como a cozinha e a casa de banho com pessoas que não conheço. O pior, nesta altura, é mesmo o perigo de contágio de Covid-19”, admite à Lusa.

Confinada a um quarto, a professora não poderá “levar a casa às costas” e muito do material das aulas de inglês vai ficar no Porto.

“Uma pessoa sente-se desmotivada. Vou estar a trabalhar a mais de 300 quilómetros de casa, preocupada com os meus pais, que não têm quem lhes acuda, preocupada com o dinheiro que não chega e cansada com as viagens aos fins de semana. Isto não é bom para ninguém”, lamenta.

Maria Santana tem colegas que ficaram colocados a 100 km de casa e optaram por fazer a viagem casa-escola todos os dias: “Descobriram que fazer 200 km por dia ficava mais barato do que alugar casa.”

A distância entre duas cidades parece ser mais curta para um professor. Para Maria Silva seria “uma sorte” ficar a 50 km de casa e Cristina Gonçalves garante que 120 km por dia “se fazem bem”.

Teresa (nome fictício) também diz à Lusa que não se importava de ficar a “50 ou 60 km de casa”, porque lhe permitia fazer a viagem diariamente.

Com um bebé ainda a amamentar e uma menina no 1.º ciclo, ficou colocada em Vila Franca de Xira, a 285 km de casa.

“Ninguém percebe que isto não mexe só connosco, mexe com toda a família”, alertou a mãe, que conta já com um currículo de quase duas décadas de instabilidade a saltar de escola em escola em contratos sucessivos.

Os professores queixam-se das novas regras do concurso de mobilidade interna, que permite aos docentes dos quadros tentar ficar numa escola mais próxima de casa.

No concurso deste ano estavam apenas disponíveis horários completos, o que significa que quando forem disponibilizados os horários incompletos alguns colegas com menos graduação poderão ficar em escolas mais perto de casa.

“Não havia vagas na cidade do Porto e em Vila Nova de Gaia só havia três”, diz Teresa, referindo-se às vagas para professores de Inglês do 1.º ciclo. Teresa está num grupo de Facebook com mais de meia centena de docentes que se queixam do concurso.

As aulas começam em meados de setembro, mas na próxima semana, os professores têm de se apresentar nas escolas para preparar um novo ano letivo que deverá ser mais exigente, visto que arranca o plano de recuperação das aprendizagens perdidas durante o confinamento.

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